sexta-feira, 16 de março de 2018

Regravações: Homenagem ou Risco?


Com  o lançamento do 2º álbum de regravações do Destruction (“Thrash Anthens II”), a banda novamente mexe com um assunto polêmico e que já deu o que falar no primeiro álbum: revisar um passado intocável, com novas versões para clássicos consagrados. Na época do 1º lançamento, o baixista e vocalista Schmier chegou se irritar em algumas entrevistas quando questionado da validade desta regravações, coisa que os fãs puritanos não gostaram. Lembro-me que ele chegou ao ponto de dizer algo do tipo “As músicas são minhas e eu faço com elas o que quiser! Quem não gostar, que ouça as versões antigas!”. Errado ele não está, mas algo que muitos músicos tentam ignorar é que a carreira da banda é o que é por conta dos fãs, e se eles não gostam de algo desse tipo, também estão no seu direito... Entretanto, o que gostaria de discutir aqui não é somente o caso do Destruction, pois, afinal de contas, uma enormidade de músicos e bandas já fizeram isso, e curiosamente uns se deram muito mal, mas outros se saíram muitíssimo bem, com resultados tão bons ou até melhores que os originais.

No caso do Destruction, o efeito negativo foi duplo: além das novas versões não fazerem jus às originais – não por serem ruins ou mal executadas, longe disso, mas a pegada da banda hoje é bem diferente de 30 anos atrás - temos também a questão das produções em si dos discos originais. No caso do Destruction em particular, os 3 albuns que são a fonte de maior parte  destas regravações (“Sentence of Death”(EP), “Infernal Overkill” e “Eternal Devastation”) são discos que têm produções únicas, que apesar de não terem sido primorosas, forjaram as músicas de maneira espetacular, ajudando a moldá-las como os clássicos que se tornaram. No caso do álbum “Eternal Devastation”, por exemplo, ninguém até hoje conseguiu reproduzir o timbre de guitarra obtido no disco, o que demonstra bem o desafio da banda em regravar estas faixas nos dias de hoje. Além disso, há um agravante: de uns anos para cá, os álbuns da banda padecem do mal gerado pelo uso do Pro Tools em excesso, com produções saturadas de polidas a perfeitas demais, que deixaram o som artificial, sem peso e sujeira característicos do estilo.

Outro que se deu mal ao fazer isso também foi o também germânico Sodom. O álbum “The Final Sign of Evil” teima em refazer o imortal EP “In the Sign of Evil”, e o resultado é bem fraco. Tal qual o Destruction, a produção era impossível de ser copiada, isso sem mencionar que ela era muito boa, com todos os instrumentos maravilhosamente nítidos e claros, mas com um peso monumental. Outro detalhe era um certo Chris “Witchhunter” na bateria, que simplesmente estava inspiradíssimo e destruiu tudo do início ao fim do disco, coisa que se perdeu na regravação, apesar desse mesmo músico ter participado deste novo projeto. Os arranjos mudaram e as músicas se desfiguraram, sendo que a única coisa que salvou o disco foram as faixas inéditas, resgatadas de demos da mesma época.

A coisa simplesmente piora quando músicos, que não os originais, encabeçam a empreitada: os Canadenses do Exciter conseguiram um belíssimo tiro no pé ao lançar “New Testament”, com uma formação que, de original, só tinha o guitarrista John Ricci. Das 15 faixas, 10 eram oriundas dos álbuns clássicos “Heavy Metal Maniac”, “Violence and Force” e “Long Live the Loud”, e que ficaram descaracterizadas sem os vocais do sensacional Dan Beehler. Apesar de bem feito, fica a sensação de que tudo não passa de um grandíssimo “cover” do material clássico do Exciter feito por uma outra banda.   



Mas há quem tenha se dado bem nessa empreitada, mesmo contando com outro vocalista que não o das gravações originais. O Anthrax conseguiu esse feito mesmo com Joey Belladonna longe da banda e tendo o igualmente sensacional John Bush nos vocais. “The Greater of Two Evils” conta com material dos cinco primeiros álbuns da banda (“Fistfull of Metal”, “Spreading the Disease”, “Among the Living”, “State of Euphoria” e “Persistence of Time”) e pôs Bush na difícil situação de cantar material de 2 vocalistas diferentes, pois Belladona assumiu o microfone do Anthrax somente a partir do segundo disco, sendo Neil Turbin a voz do álbum de estréia, saindo logo depois. E o resultado é muito, mas muito bom, não somente pela pegada da banda que manteve o espírito dos registros originais, mas pela voz de Bush que caiu como uma luva no “novo” material. 


Outro que também se deu bem foi o Testament com “The First Strike Still Deadly”. Confesso que não sei exatamente a razão da banda regravar faixas somente dos dois primeiros discos, “The Legacy” e “The New Order” (direitos autorias, será? Ambos saíram pela Megaforce, gravadora responsável pelos lançamentos à época). Apesar da mudança da formação clássica – Loue Clemente não estava mais nas baquetas, posto assumido interinamente por John Tempesta – a banda conseguiu tonar mais visceral faixas que já eram excelentes, talvez por reproduzir o pique que já davam a este material mais antigo ao vivo. A questão que o disco é excelente e faz frente ás versões originais.

Para fechar, um caso esquisito e que me deixa indeciso é o do Exodus, que resolveu fazer a releitura do mega/ultra/clássico “Bonded by Blood”, de 1985. O resultado foi “Let There Be Blood”, que ainda trazia de bônus a faixa “Hells Breath”, conhecida apenas de demos antigas da banda. O problema é que a quantidade de prós e contras era grande, e por isso o resultado ficou 50/50. O contra principal era o fato de regravar um clássico absoluto, um dos pilares do Thrash Metal Bay Area, fruto da mesma safra de “Kill Em All”, “Show No Mercy” e “Fistfull of Metal”, por exemplo. Além disso, o falecido e icônico Paul Balloff imortalizou as vozes desse álbum, isso sem mencionar o fato de ter sido um frontman único e perfeito para o perfil do grupo. Como Balloff morreu, obviamente outro vocalista regravou o álbum, e este foi Rob Dukes. O detalhe é que Dukes tinha um perfil vocal mais gritado/berrado, um pouco diferente de Balloff. Apesar do seu esforço em seguir as linhas originais e o tom de Balloff, é inegável que os vocalistas são distintos. E por fim, outro detalhe é que a produção do álbum original era muito boa, não havendo nenhuma necessidade, no aspecto técnico, de regravar o disco em função desse quesito.    

Mas o disco ficou bom? Sim, ficou. O instrumental é monstruoso, mesmo contando apenas com dois membros da gravação original (Gary Holt e Tom Hunting, guitarra e bateria, respectivamente), a banda em si é extremamente fiel aos arranjos originais, conseguindo um efeito extremamente positivo na produção, que obteve um peso matador (ouça “And Then There Were None” e confirme se não estou certo). Nesse quesito não há o que reclamar, mas os vocais, como dito anteriormente, não são os originais e o perfil de Dukes não é o adequado para esse álbum. A prova disso é que desde sua entrada (após a segunda saída de Zetro Souza, esse sim mais conectado ao trabalho de Balloff) o Exodus direcionou seu Thrash para um estilo mais moderno, onde Dukes se encaixou melhor. No fim das contas, a saudade bate e, entre ouvir este e o original, fico com o original...

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