terça-feira, 22 de janeiro de 2019

E se Tivesse Sido Diferente?


Muito me surpreende que ninguém nunca tenha levantado a seguinte questão: e se o Slayer e o Exodus tivessem lançado seus álbuns de estréia antes do Metallica? Teria a banda esta aura percursora do Thrash Metal que tem hoje? Sempre achei que não, e mais: sempre considerei isso um absurdo sem tamanho, uma vez que é notório que o Metallica não iniciou nada sozinho. A Bay Area de São Francisco ficou conhecida na década de 80 por ter tido uma cena composta de diversas bandas: além dos já citados, havia também Death Angel, Forbidden , Heathen, Testament, Vio-Lence, Possessed e etc.. Entretanto, quis o destino que o Metallica fosse o primeiro a lançar o seu debut, ainda que o mercado de demo tapes estivesse devidamente abastecido com lançamentos de todas as bandas em atividades na época, ou seja, opções não faltavam. Com isso, a banda conseguiu uma fama não merecida, ainda que seu “Kill Em All”, apesar de um excelente disco, fosse ser “engolido” meses depois pela estréia do Slayer, o brutal “Show No Mercy”, infinitamente mais violento, rápido, técnico e impactante.

Em termos de surgimento, o Exodus é a banda mais antiga, tendo se iniciado em 1979, com Metallica e Slayer iniciando suas atividades em 1983. Passada a fase de demos, o Metallica lançou seu “Kill ´Em All” em 25 de Julho de 1983; pouco mais de 4 meses depois, o Slayer lançaria o “Show No Mercy” (03 de Dezembro de 1983). O Exodus, apesar de mais antigo, teve um tremendo azar por problemas com a gravadora, só conseguindo lançar seu debut (o magnífico “Bonded by Blood”) quase dois anos depois do Metallica, em 25 de Abril de 1985. Para se ter uma idéia do atraso que isso representou, nessa época tanto Metallica quanto  Slayer, já haviam lançado seus álbuns seguintes, respectivamente “Ride The Lightning” (Julho de 1984) e “Hell Awaits (Março de 1985). Ainda que a banda já fosse muito conhecida localmente, o reconhecimento mundial veio tardiamente, isso sem mencionar no retorno mercadológico, uma vez que as outras bandas já se encontravam bem mais estabilizadas.

Analisando individualmente, é óbvio que as bandas tiveram direcionamentos distintos dentro do Thrash Metal. Enquanto o Slayer absorveu as influências do Venom e as elevou a uma potência maior, com um som mais rápido, agressivo e com a mesma temática satânica, o Metallica optou por um som mais cru e rápido, mas menos técnico. Dos três, quem mais se destacou neste quesito foi o Exodus, que apresentou um disco com uma variação absurda entre a velocidade e peso, com um show à parte do baterista canhoto Tom Hunting. Além dele, Gary Holt e Rick Hunolt nas guitarras foram responsáveis por riffs absurdamente sensacionais.

Na minha concepção, em nada interferiu o Slayer haver lançado seu disco de estréia depois do Metallica, pois os direcionamentos e, consequentemente, os públicos seriam diferentes. A história mostrou que a banda tinha uma áurea própria, totalmente independente do Metallica. Entretanto, sempre imaginei que se “Bonded By Blood” tivesse vindo antes, a coisa seria diferente em termos de impacto pois, tecnicamente, ele é um álbum infinitamente superior ao “Kill ‘Em All”. Os riffs são melhores, as linhas de bateria são mais complexas e as músicas – e eu digo TODAS – são sensacionais, o que não ocorre no disco do Metallica. Sempre considerei aquele solo de baixo do Cliff Burton muito legal de ser feito no show, mas muito cansativo no disco. Além, do mais, há uma música claramente abaixo das demais, a enfadonha “Jump In The Fire”, cujo riff linear é repetitivo demais. No disco do Exodus temos as destruidoras “And Then There Were None”, “Piranha” e “Strike of The Beast”, só para citar três exemplos de diversidade, técnica e variação.

Se levarmos em conta os músicos, o Exodus levava certa vantagem por ter um baterista fora da curva. Não que Lars Ulrich fosse ruim – pelo menos ainda não era, pois ele só se transformaria em um pastiche de si mesmo anos mais tarde – mas Tom Hunting era (e ainda é) muito superior a ele. Ulrich sempre foi um baterista mais simples, embora tenha tido um desempenho soberbo em pelo menos dois álbuns, na minha modesta opinião: “Ride The Lightning” e “...And Justice For All”. Já Hunting provou, até mesmo nos álbuns seguintes do Exodus – isso sem mencionar ao vivo – o quanto era bom, estando num mesmo patamar do mestre Dave Lombardo. Neste ponto, Slayer e Exodus ficavam empatados.


Um argumento válido e que não posso desconsiderar seria o seguinte: “Mas os 3 primeiros do Metallica são clássicos, ao passo que o Exodus não conseguiu esse feito”. Ok, pois “Kill ‘ Em All”, “Ride The Lightning” e “Master of Puppets” são realmente icônicos, ao passo que o Exodus conseguiu apenas “Bonded by Blood” nesta categoria. Os seguintes, “Pleasures of the Flesh” e “Fabulous Disaster”, apesar de muito bons discos, tem lá seus defeitos. Em nenhum momento disse que possivelmente a história seria diferente se o Exodus tivesse lançado sua estréia primeiro, fazendo com que o Metallica não conseguisse o sucesso que teve. Disse apenas que essa aura de “Pais do Thrash Metal” não existiria. Independente da ordem dos discos, a qualidade deles falaria mais alto e o sucesso seria o mesmo.  Mas acho que o Exodus teria mais sorte em alguns quesitos: Paul Ballof possivelmente teria tido tempo de cantar em mais de um disco; Com mais estrada, os albuns talvez viessem mais consistentes e até melhores produzidos, em especial o segundo; Por fim, a banda teria sobrevivido à década de 90, onde Metallica e Slayer conseguiram atravessar praticamente incólumes à ascensão do famigerado Grunge, que atingiu em cheio o mercado americano.